O câncer infantil envolve um conjunto de doenças complexas e desafiadoras que afeta um número significativo de crianças e adolescentes. No Brasil, cerca de 12 mil novos casos de câncer infantil são registrados a cada ano. Essas doenças podem ser caracterizadas pela proliferação descontrolada de células anormais em diferentes partes do corpo que não obedecem sua função.

Ao contrário do câncer em adultos, que muitas vezes está associado a fatores como envelhecimento, tabagismo e dietas inadequadas, o câncer infantil não tem uma ligação direta com esses fatores ambientais. Na maioria dos casos, a origem do câncer em crianças e adolescentes ainda é desconhecida, podendo estar correlacionado a predisposição genética ou mutações genéticas ocasionais.

Reconhecendo os Sintomas

Identificar o câncer infantil pode ser desafiador, pois muitos sintomas se assemelham a condições mais comuns em crianças. É importante que os pais fiquem atentos a sinais como:

• Perda de peso inexplicável: Se a criança está perdendo peso sem motivo aparente.
• Dores de cabeça persistentes: Principalmente se acompanhadas de vômitos matinais.
• Inchaço ou dor persistente: Especialmente nas articulações ou ossos.
• Massa abdominal ou em outras áreas: Pode indicar tumores como o de Wilms ou neuroblastoma.
• Mudanças na visão: Como uma aparência esbranquiçada na pupila, ou estrabismo.
• Febres frequentes: Sem causa aparente, que não são explicadas por infecções comuns.
• Hematomas e sangramentos: Inexplicáveis e repentinos.
• Palidez e cansaço prolongado: Que não melhoram com descanso.

Se você notar qualquer um desses sinais, é crucial levar a criança ao pediatra para uma avaliação detalhada, sendo muito importante manter acompanhamento regular com o pediatra para estas possíveis investigações. O diagnóstico precoce é essencial, pois aumenta significativamente as chances de sucesso no tratamento.

Principais Tipos de Câncer Infantil

Leucemias: A leucemia é o câncer mais comum na infância, originando-se na medula óssea, onde são produzidas as células do sangue. As células alteradas pela leucemia se espalham pelo sangue e podem atingir outros órgãos como os gânglios, baço, fígado, o sistema nervoso central e os testículos. 

A medula óssea, localizada no interior dos ossos, é responsável pela produção de glóbulos vermelhos, brancos e plaquetas. Nas crianças, está ativa em quase todos os ossos, enquanto nos adolescentes, é encontrada principalmente nos ossos planos e nas vértebras. A medula é composta por células-tronco hematopoiéticas, que se dividem para formar novas células sanguíneas maduras.

Na leucemia, as células-tronco do sangue tornam-se anormais e se multiplicam rapidamente, substituindo as células saudáveis. Existem dois tipos principais de leucemia, dependendo da célula-tronco envolvida:

Leucemia Linfocítica (ou linfoide): Originada das células-tronco linfoides que produzem glóbulos brancos, quando afetados pela doença esses glóbulos não conseguem combater infecções e se proliferam excessivamente.

Leucemia Mieloide: Originada das células-tronco mieloides, se proliferam globulos brancos imaturos (mieloblastos) que se tornam cancerosos e substituem as células sanguíneas saudáveis.

A forma aguda é a mais comum na infância, representando 95% dos casos de leucemia infantil, sendo 75% leucemia linfoide aguda e 20% leucemia mieloide aguda. As formas crônicas, que representam apenas 5% dos casos, são todas do tipo leucemia mieloide crônica.

Tumores do Sistema Nervoso Central: Os tumores do Sistema Nervoso Central (SNC) são os tumores sólido mais prevalente na infância, ultrapassados apenas pelas leucemias, consistindo por aproximadamente 20% das neoplasias abaixo de 15 anos e em sua grande maioria se apresenta na primeira década de vida.

Ainda não existem estudos comprovando os fatores de risco para o desenvolvimento dos tumores de SNC na infância, porém existem condições predisponentes conhecidas, como a exposição à radiação ionizante e a associação com síndromes genéticas como neurofibromatose, complexo de esclerose tuberosa e a síndrome de Li-Fraumeni, que consistem em torno de 10% dos casos

Linfomas: O linfoma é um tipo de câncer que afeta o sistema linfático. O sistema linfático, inclui uma rede de vasos e gânglios, além de órgãos como o timo, o baço e as amígdalas. Este sistema é responsável por coletar e redirecionar a linfa, um líquido claro que contém células de defesa chamadas linfócitos.

Existem dois principais tipos de linfoma: linfoma de Hodgkin e linfoma não Hodgkin. Estima-se que 3.530 novos casos de linfoma de Hodgkin sejam diagnosticados este ano, com uma distribuição de 1.480 casos em homens e 1.050 em mulheres.

Muitos pacientes não apresentam sintomas por um período prolongado, e, quando os sintomas aparecem, o primeiro sinal frequentemente é o surgimento de nódulos inchados e indolores no pescoço, tórax, abdômen ou virilha, o que leva à consulta médica e ao diagnóstico.

Os sintomas adicionais podem incluir:

• Suores noturnos intensos, com ou sem febre
• Febre ou calafrios, que podem ocorrer à noite ou durante o dia
• Perda de peso sem motivo aparente
• Fadiga
• Coceira sem motivo aparente
• Tosse e dificuldade para respirar, aumento do fígado ou do baço

Neuroblastoma: O neuroblastoma é um tipo de câncer que quase sempre se desenvolve em crianças de até 5 anos, mais frequentemente diagnosticado entre 1 e 2 anos de idade. Em alguns casos, pode ser detectado por ultrassonografia antes mesmo do nascimento. Este câncer origina-se de células nervosas primitivas do sistema nervoso simpático, uma parte do sistema nervoso autônomo que regula funções essenciais como respiração, pressão arterial, batimento cardíaco e digestão.

A maioria dos neuroblastomas se desenvolve nas glândulas adrenais, localizadas acima dos rins, no abdômen, ou nos gânglios dorsais próximos da coluna espinhal. Também pode se formar no tórax, pescoço ou espinha. A gravidade do neuroblastoma tende a ser maior em crianças com mais de 1 ano e meio, e a progressão pode variar de lenta a rápida.

Sintomas Comuns:

• Hematomas , Diarreia, Perda de apetite e peso , Fadiga,
• Nódulos no abdômen, lombar, pescoço ou tórax
• Dor nos ossos, pálpebras caídas e olhos saltados,
• Abdome inchado ou distendido , Irritação, Fraqueza ou paralisia das pernas,
• Febre, anemia e pressão alta,  Inchaço das pernas ou escroto
• Problemas para urinar ou defecar,
• Dor de cabeça e tontura

Os sintomas podem variar dependendo do tamanho e localização do tumor, se ele se espalhou e se produz hormônios. Às vezes, o neuroblastoma pode não apresentar sintomas ou pode ser confundido com doenças mais comuns, o que pode atrasar o diagnóstico.

Tratamento do Câncer infantil

O tratamento do câncer infantil é complexo podendo envolver uma combinação de quimioterapia, cirurgia e/ou radioterapia, adaptada para cada tipo e estágio da doença e idade do paciente.

Com os avanços na medicina, cerca de 70% das crianças e adolescentes com câncer podem ser curados, especialmente quando a doença é diagnosticada precocemente e tratada em centros especializados. Tratamentos especiais com o Transplante de Medula Óssea e CarT Cell, podem ser necessários e utilizados durante o tratamento.

O tratamento não se restringe apenas à cura da doença, mas também inclui o cuidado integral da criança e de sua família. A equipe de tratamento, composta por oncologistas pediátricos, cirurgiões, radioterapeutas, patologistas, enfermeiros, fisioterapeutas, terapeuta ocupacional, assistentes sociais, psicólogos e nutricionistas, trabalham em conjunto para oferecer o melhor suporte possível.

Durante o tratamento, a criança deve ter cuidados especiais para evitar infecções devido à imunidade reduzida. Isso inclui evitar ambientes aglomerados, alimentos crus, e proteger a pele da exposição excessiva ao sol. A presença de um nutricionista é fundamental para orientar sobre a alimentação adequada durante a terapia.

Apoio Emocional e Social

Enfrentar o câncer infantil é um desafio emocional enorme para o paciente, mas também para toda a família. Medo do tratamento, da quantidade de exames realizados, ansiedade sobre as internações, sintomas da doença, efeitos colaterais dos tratamentos e mudança de rotina são extremamente comuns dentre os pacientes, sendo expressa cada qual com sua forma individualizada.

Da mesma forma pais e cuidadores frequentemente se sentem desorientados e angustiados, lidando com o medo e a incerteza que acompanham a doença. É fundamental que as famílias recebam não apenas tratamento médico, mas também suporte emocional e psicológico profissional. O acolhimento e a compreensão são essenciais para ajudar a lidar com as dificuldades diárias e proporcionar um ambiente de apoio para a criança.

Podemos concluir então que:

Embora o câncer infantil seja uma doença rara e desafiadora, os avanços no tratamento têm proporcionado uma taxa de cura e sobrevida cada vez maior e sempre com mais qualidade.

A detecção precoce e o tratamento especializado são cruciais para garantir as melhores chances de recuperação. Ao estar atento aos sinais e procurar ajuda médica rapidamente, você pode fazer uma grande diferença na vida de uma criança diagnosticada com câncer.

Além disso, o suporte contínuo à família e à criança é vital para enfrentar essa difícil jornada e assegurar a melhor qualidade de vida possível para o futuro.

O texto tratou de parte dos principais tumores e em uma parte II serão apresentados os demais canceres infantis.

Texto elaborado por Dr. Lucas Augusto Monetta Silva, médico pediatra, residente de oncopediatria e membro da equipe BIO SANA’S, Hospital São Camilo e IBCC Oncologia de Transplante de Medula Óssea.

Para saber sobre transplante de medula óssea, basta clicar no link abaixo:

Quais as etapas do Transplante de Medula Óssea (TMO)? CLIQUE AQUI